segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Vamos mudar de casa

Sabem aquelas decisões que no mundo ocidental são bem ponderadas e levam muito tempo a tomar? O mudar de casa é um bom exemplo. Por cá, aparenta ser a coisa mais normal e tranquila do mundo. Como tudo, vive-se o dia-a-dia, não há preocupações, não há stress, não há planos. Aceita-se alegremente o que a vida tem para oferecer, seja bom ou mau. Aliás, nem se pensa se será bom ou mau, melhor ou pior, simplesmente aceita-se e vive-se alegremente com isso.


Hoje à tarde chego à Kilt e vejo o mais velho a arrancar uns troncos das árvores, com a rapariga mais velha a transportá-los para a entrada da instituição. Pergunto o que se passa e a resposta foi: "vamos mudar de casa". Fiquei perplexo, mas o que mais me surpreendeu foi a naturalidade com que foi dito. Perguntei porque, não sabiam, perguntei para onde, tinham apenas uma ideia, perguntei se era para um sitio melhor, não faziam ideia, perguntei quando era a mudança e a resposta foi que daqui a 2/3 semanas já lá estavam. Souberam hoje, assim como eu. Não sabia o que dizer, optei por ajudar. A nova professora foi dar aula, eu fiquei com o mais velho a carregar troncos, que é como quem diz, a carregar os pilares dos novos quartos, da nova cozinha, da nova casa de banho, sala de aula ou qualquer coisa que nos lembremos de construir. Ao pé daquilo, o meu amigo que me oferece televisões, um tal de Fernando Mendes, é leve como uma pena. 
Após o ginásio, falei com o responsável da Kilt a perguntar o que se passava. O contracto do terreno actual está a expirar e aquilo vai ser vendido. Já têm um sitio novo, não me soube dizer se melhor ou pior (deve ser pior), apenas disse que é mais pequeno e sem um muro à volta como este tinha. Mais longe da cidade e da escola dos miúdos, mas nenhum está preocupado com isso. Têm 2 ou 3 bicicletas e 2 motos, capazes de transportar 4 ou 5 duma vez, para se deslocarem. Estão super descontraídos e relaxados com a mudança, mesmo sem saber bem o sitio para onde vão e sem o conhecerem. 
Tudo será construído de novo, pelos 3 mais velhos (16, 18 e 19 anos) e… por mim. Disse que não sabia construir nada mas tinha bom corpo para carregar e são mais dois braços para ajudar. Pelo que me explicaram, os rapazes tratam da construção em si, os mais pequenos prestam auxilio com os pregos e arames e as raparigas mais velhas tratam das coberturas. As coberturas são como que cascas dos troncos das árvores (não sei outra maneira de chamar àquilo), pequenas, todas umas a seguir às outras presas por um fio. Umas camadas daquilo, tudo seguido e está feito. Além disso, há placas de metal, as paredes. Disseram-me que uma divisão, como a cozinha, se faz num dia. Eu acredito e vou aprender. Nunca se sabe o que a vida nos reserva, quem sabe um dia não venha a ser útil saber pegar nuns troncos e numas placas de metal e montar um quarto, uma cozinha ou o quer que seja.
Já disse aos rapazes, seja onde for, os quartos vão ter que ficar melhores e maiores. Juntos vamos melhorar as condições deles, afinal isto pode apenas ser visto como um oportunidade para isso. Seria bem bom deixar o Camboja com os meus pequenos grandes benfiquistas num sítio melhor que aquele onde os encontrei, com alguma mãozinha minha. Pouca, para que nunca acordem com uma parede no chão ou sem tecto. Esta semana ainda, provavelmente, começamos as obras.


Por fim e por falar em troncos e árvores, se no outro dia, enquanto pedalava por uma estrada principal mesmo junto ao rio caiu um ramo 2 metros à minha frente, hoje de manhã, quando já estava na bicicleta pronto a pedalar para ir embora da Kilt, oiço um estrondo enorme. Sai da Kilt e vejo que a rua estava no estado que podem ver na foto. A árvore ali mesmo ao lado, simplesmente, tombou. Era  ter aguentado mais 1 minuto de pé e não estaria a escrever a estas horas. Surreal. Ainda assim, mesmo com árvore caída, a cortar o transito e capaz de matar uns quantos, não houve a mínima complicação ou preocupação das pessoas. 


Isto é o Camboja. Eu gosto, demasiado até.

4 comentários:

  1. Não podias teres escolhido para o teu blog melhor nome "aventuras....". tem cuidado, apesar das fotos serem "censuradas" ainda não vi um capacete na tua cabeça. Por favor, aumenta o teu património no Camboja e adquire um. Será um bom investimento, pois apesar de ainda não o teres admitido oficialmente, já me apercebi que a tua "bike", não tem travões. Com o que publicas, até me arrepio, olha que não sou de "ferro", evidentemente que estou a falar dos meus intestinos.

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  2. "Não me dez fezes", como se diz em alentejano---

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  3. Parece-me que já percebi parte do "porquê" da mudança...
    Não me digas que foi nessas árvores que trepaste no início das tuas tarefas de "teacher"!

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  4. sabes o que faz falta no Camboja? Três ou quatro guias. Se eu e as minhas companheiras aí estivessemos esse sítio ficava como novo. Sabemos transformar qualquer pedaço de terreno num lar com alguns troncos.

    Boa sorte com as construções!
    Para animar as paredes do novo lar, o teu aluno artista podia fazer uns desenhos para serem postos na parede. Alegra o ambiente digo eu...

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