Quem sai aos seus não degenera. Querido pai,
ontem inspirei-me na tua sabedoria e desenhei a planta da casa nova. Dei-te
um bigode já que o fiz sem recurso a fita métrica e apenas dispus de uma régua
(tive que a ir comprar) e uma caneta. Eu gostei, os miúdos adoraram e
o Bel aprovou. Ordem para avançar com a obra à primeira e contrário de ti, seu engenheirozeco, além de
apenas dar o aval e ir ver a obra com aquele capacete branco,
serei eu próprio a fazê-la, juntamente com os pequenos grandes benfiquistas, e sem
qualquer protecção.
Minha querida mãe, hoje inspirei-me em ti e fui um
autêntico professor de matemática. A ti então, dei-te um enorme bigode.
Não “congelei
naquele liceu”, não
gritei com miúdo nenhum, não mandei trabalhos de casa e nem fiz verdadeiras perseguições aos miúdos para que
eles trabalhassem. Contigo e com o que sofri naquele 12ºano, aprendi o que não
devo fazer para que os miúdos não fiquem traumatizados e não fiquem a odiar-me a mim e à
matemática. Tenho a informar-te também que hoje quando acordei nem uma conta de
somar sabia fazer à mão. Muito
menos subtracções, multiplicações ou divisões. Aprendi tudo hoje, para à tarde
ensinar.
Foi das aulas que mais gostei de dar. A outra
professora ficou com os mais pequenos, eu fiquei apenas com dois, os dois que
melhor falam inglês. Sovann, o mais velho, e a Sochea, de apenas 12 anos.
A brincadeira surgiu porque a rapariga é daquelas meninas super aplicadas, só
me mostra 9 e 10 na escola de Khmer. Faz sempre tudo o que peço (quase
sempre vá, não exageremos), e é a única com um caderno
limpo e organizado. Ontem perguntei-lhe pelas notas, mantêm-se os 9 e os 10 excepto a matemática que tinha 2, 4 ou
6. Ela, também na
escola de Khmer, é por norma a melhor
aluna. Adaptei então o inglês
para “plus,
minus, times and divided by” e fomos resolver o problema. Hoje ensinei-lhe as 4 operações. O
tempo passou a correr no meio de números enormes que iam
até aos 6 algarismos. No fim, já bem para lá da hora, não falhava um. Amanhã fazemos igual. Estou curioso
para ver o seu caderno das aulas amanhã, por certo terá melhor notas. Ela mais confiante e
entusiasmada está. Falei-lhe num 7 amanha, e num
9 sexta-feira. Acredito que ela chegue ao 10 nos dois dias.
À hora de
almoço, além da descoberta de como fazer cálculos matemáticos no papel, foi
hora de espalhar mais um bocadinho a chama imensa por cá.
Sobraram-me cerca de 20 equipamentos daqueles que entreguei aos meus pequenos
benfiquistas (o Benfica é mesmo um clube generoso sem igual), decidi entregar
todos ao touch a life. Às segundas
quartas e sextas, a responsável tem mais de 100 crianças a almoçar em sua casa.
Não chegam para todos mas ela, melhor que ninguém, sabe quem mais precisa por cá e quem realmente fica contente por
receber o manto sagrado. Desta vez, não vejo o efeito prático nem a alegria das
crianças ao vestirem tão pesada camisola, mas fico realmente feliz por lhes ter
dado o melhor destino. Fico feliz ao saber que acabam nas mãos de
miúdos que
precisam delas, tanto ou mais que os meus pequenos grandes
benfiquistas.
À
noite, foi tempo para descontrair e experimentar o famoso, por cá, Lady Boy
Show. Essa aventura fica para relatar amanhã.
Fazer só contas de cabeça é o que dá. A mãe diz que deveria ter sido mais exigente contigo, o trauma seria o mesmo e ter-te-ia poupado muito trabalho, assim, hoje.
ResponderEliminarQuanto à arquitectura/engenharia é preciso medir, calcular, raciocinar...enfim ter engenho e mãos-à-obra. Desejo que faças uma boa casa para os teus queridos grandes benfiquistas.
Quanto ao Show, só o nome dá que pensar...o relato da aventura promete!