quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Quem sai aos seus não degenera

Quem sai aos seus não degenera. Querido pai, ontem inspirei-me na tua sabedoria e desenhei a planta da casa nova. Dei-te um bigode já que o fiz sem recurso a fita métrica e apenas dispus de uma régua (tive que a ir comprar) e uma caneta. Eu gostei, os miúdos adoraram e o Bel aprovou. Ordem para avançar com a obra à primeira e contrário de ti, seu engenheirozeco, além de apenas dar o aval e ir ver a obra com aquele capacete branco, serei eu próprio a fazê-la, juntamente com os pequenos grandes benfiquistas, e sem qualquer protecção.
Minha querida mãe, hoje inspirei-me em ti e fui um autêntico professor de matemática. A ti então, dei-te um enorme bigode. Não congelei naquele liceu, não gritei com miúdo nenhum, não mandei trabalhos de casa e nem fiz verdadeiras perseguições aos miúdos para que eles trabalhassem. Contigo e com o que sofri naquele 12ºano, aprendi o que não devo fazer para que os miúdos não fiquem traumatizados e não fiquem a odiar-me a mim e à matemática. Tenho a informar-te também que hoje quando acordei nem uma conta de somar sabia fazer à mão. Muito menos subtracções, multiplicações ou divisões. Aprendi tudo hoje, para à tarde ensinar.
Foi das aulas que mais gostei de dar. A outra professora ficou com os mais pequenos, eu fiquei apenas com dois, os dois que melhor falam inglês. Sovann, o mais velho, e a Sochea, de apenas 12 anos. A brincadeira surgiu porque a rapariga é daquelas meninas super aplicadas, só me mostra 9 e 10 na escola de Khmer. Faz sempre tudo o que peço (quase sempre vá, não exageremos), e é a única com um caderno limpo e organizado. Ontem perguntei-lhe pelas notas, mantêm-se os 9 e os 10 excepto a matemática que tinha 2, 4 ou 6. Ela, também na escola de Khmer, é por norma a melhor aluna. Adaptei então o inglês para plus, minus, times and divided by e fomos resolver o problema. Hoje ensinei-lhe as 4 operações. O tempo passou a correr no meio de números enormes que iam até aos 6 algarismos. No fim, já bem para lá da hora, não falhava um. Amanhã fazemos igual. Estou curioso para ver o seu caderno das aulas amanhã, por certo terá melhor notas. Ela mais confiante e entusiasmada está. Falei-lhe num 7 amanha, e num 9 sexta-feira. Acredito que ela chegue ao 10 nos dois dias.
À hora de almoço, além da descoberta de como fazer cálculos matemáticos no papel, foi hora de espalhar mais um bocadinho a chama imensa por cá. Sobraram-me cerca de 20 equipamentos daqueles que entreguei aos meus pequenos benfiquistas (o Benfica é mesmo um clube generoso sem igual), decidi entregar todos ao touch a life. Às segundas quartas e sextas, a responsável tem mais de 100 crianças a almoçar em sua casa. Não chegam para todos mas ela, melhor que ninguém, sabe quem mais precisa por cá e quem realmente fica contente por receber o manto sagrado. Desta vez, não vejo o efeito prático nem a alegria das crianças ao vestirem tão pesada camisola, mas fico realmente feliz por lhes ter dado o melhor destino. Fico feliz ao saber que acabam nas mãos de miúdos que precisam delas, tanto ou mais que os meus pequenos grandes benfiquistas.

À noite, foi tempo para descontrair e experimentar o famoso, por cá, Lady Boy Show. Essa aventura fica para relatar amanhã.

1 comentário:

  1. Fazer só contas de cabeça é o que dá. A mãe diz que deveria ter sido mais exigente contigo, o trauma seria o mesmo e ter-te-ia poupado muito trabalho, assim, hoje.
    Quanto à arquitectura/engenharia é preciso medir, calcular, raciocinar...enfim ter engenho e mãos-à-obra. Desejo que faças uma boa casa para os teus queridos grandes benfiquistas.
    Quanto ao Show, só o nome dá que pensar...o relato da aventura promete!

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