Antes do epílogo final, a
paragem na china é sempre merecedora de alguns comentários.
Após 3 horas de voo, o
primeiro, e muitas de espera, estou no aeroporto pronto a embarcar. A espera
está a deixar-me de olhos em bico, segue-se um voo de 13 horas até... Paris.
Não gosto de chineses, cada vez
gosto menos. Já o tinha dado a entender no primeiro post, reforçado num dos
dias de touch a life onde os otários estavam por lá para o show off e ajudar
nada. Hoje confirmo, salvo raras excepções que também devem existir, esta gente
é estúpida.
Os do touch a life eram para lá
de estúpidos. Daqueles que chegam ao Cambodja disfarçando-se de voluntários para
trabalhar redes sociais. Justiceiros de meia tigela, desumanos como a
desumanidade que denunciam, egoístas apesar de iludidos com uma suposta superioridade moral.
Voltando aos otários,
desculpem, aos chineses. Estou sentado no chão do aeroporto porque eles são
mais que as mães. Não são mais que os bancos existentes mas acham por bem deitarem-se de
maneira a ocupar 3 ou mais bancos e/ou sentar as malas quando há pessoas, idosas, de
pé. São barulhentos, nunca uma aula
minha com 20 moços teve tanto barulho como isto. Transportam miúdos como cães,
literalmente, por uma trela ao pescoço. A net existe mas a liberdade é tanta
neste país que não dou um site aberto. Os gajos do controlo das malas, de cabelo à tigela e
cabeça de esguenha olham atentamente e, muito, muito lentamente para dentro
das malas. Os seguranças não fazem perguntas, gritam com a mania de maus para
onde vou. Será que é assim tão difícil de perceber que só aterrei aqui porque eles têm aviões que, volta e meia, caem e portanto são os mais baratos? Tive meia
hora numa fila, mais uma, de controlo de imigração. A sério? Mas alguém no
seu perfeito juízo (o meu grande amigo Sandro que me desculpe) quer imigrar para aqui? Se algum dia, numa das muitas ideias que tenho para a minha
a vida por raramente estar satisfeito com o que faço em Portugal, sugerir ir
para a China, estão autorizados a dar-me a um tiro. Se isso acontecer é porque
desta cabeça já não se aproveita nada.
Entretanto, os otários,
desculpem, os chineses já me embarrilaram. Eram 10 da noite e ainda não tinha
comido nada desde o pequeno almoço. Não deu para aguentar mais, tive que ir à
caça dos yuans. 20 doláres por uma sandes, no camboja nem 3 seriam.
Mais um choque, dos muitos que
me esperam. Os otários, desculpem, os chineses deram-me hotel dado que a escala
era superior a 8 horas. Voltei assim à cidade, à civilização. Estou em choque.
Que confusão que está a minha cabeça agora.
Estradas alcatroadas com
diversas faixas. Regras de trânsito. Edifícios enormes. O hotel era enorme, 14
blocos de edifícios com tudo. Lojas, piscinas, saunas, jacuzzis, banhos turco,
coisas supérfluas para quem acaba de chegar do Cambodja. Mundos diferentes.
E agora quem me leva à
realidade? Depois de 2 meses onde a liberdade era a palavra de ordem, quem me
volta a colocar regras, a maioria delas estúpidas?
E agora? A t-shirt porca e
velha vai dar ao lugar ao fato. As pulseiras darão lugar ao relógio. Os colares
à gravata. Os anéis… a nada mas continuo casado com os pequenos grandes
benfiquistas. A bicicleta dará lugar ao carro. O tuk-tuk ao metro. As motos com
5 pessoas a autocarros. O pó e a poeira à poluição do pára arranca. As
passadeiras são para respeitar. O andar em contra-mão desapareceu, o próprio
andar desapareceu no meio de tanto semáforo e fila onde travar e parar é a
palavra de ordem. Os sorrisos cambojanos darão lugar a caras de pau de gente mal
humorada. Os monges laranjas a engravatados com mania de importantes. Os budas desapareceram. O entrar
descalço em qualquer casa dará lugar aos sapatinhos engraxados. O arrotar à mesa ao
perdido de licença para começar a comer. Os pauzinhos aos talheres, O arroz a
tudo e mais alguma coisa. O calor dará lugar ao frio, sim descobri que o
Alentejo afinal é frio no verão. A chuva e as trovoadas diárias de bem-vindas
para limpar a terra e o suor passarão a coisa non grata recebida de guarda-chuva.. Os 6 litros de água diários darão lugar a 1 ou 2, agora da torneira. As
casas de madeira e palhotas com folhas de árvores a arranha-céus enormes. A música
khmer às piadas do Markl. Os cabeleireiros de rua darão lugar a superfícies. A electricidade não falhará tanto, mas há uns homens da MEO para
insultar quando algo correr mal. Os fruit shakes diários darão lugar ao café. A diversidade de frutas a maças e laranjas. A dragon fruit desapareceu. O repelente
ao perfume. A angkor beer à sagres. Os bichos a pessoas. O cheiro nauseabundo
dos mercados ao cheiro de sovacos mal lavados, ainda que haja gel de banho por
cá. Os mercados a enormes supermercados. Os espaços verdes a fábricas. O khmer a alentejano e o inglês ao português. A liberdade a regras e politiquismos. A descontracção a preocupações e stress. O inesperado ao planeado. O acordar todos os dias com tarefas novas e inesperadas a uma rotina sem piada nenhuma. As horas de exercício e de um lado para o outro darão lugar a horas em frente ao computador.
Não, ainda agora vim embora e quero voltar para a ilha...
Pior, vou de um sitio onde sou feliz e útil para um local onde sou apenas mais um. Mais um descontente que acorda a querer dormir mais, para ir trabalhar naquilo que não gosta e esperar o ordenado ao fim do mês. Faz-me sentido? Nenhum.
Deixo gente que precisa de mim e de quem gosto, para um sitio onde pouca ou nenhuma diferença faço. Deixo um local de pessoas de bem, que partilham o pouco que há e se ajudam mutuamente para um local onde não se olha a meio para atingir os fins. Onde somos todos amigos mas, se for preciso, passamos por cima de alguém para ganhar mais qualquer coisa sem pensar duas vezes. No Cambodja, mesmo as crianças do touch a life não passavam à frente de ninguém na fila para ganhar a refeição da semana. Deixo um local de pessoas que nunca se queixam do pouco que têm por um local onde todos se queixam do pouco que lhes falta. Deixo um local de pessoas felizes para um sitio maioritariamente de infelizes. Deixo um local de pobres mas ricos por um local de ricos mas pobres. Deixo um sitio sem dinheiro para um sitio onde se vive para o dinheiro, basicamente por dinheiro. É assim, vivemos para isso e ele faz falta em qualquer lugar.
Faz sentido? Nenhum. Vale-me saber que o voltar e a data do regresso dependem só e apenas de mim. Motiva-me saber que todo e qualquer dinheiro que venha ganhar, só não será bem gasto se eu não quiser. É para o ganhar que regresso, é para o gastar que voltarei ao Cambodja.
Isto das raças e dos costumes tem muito que se lhe diga. Eu - não sou daltónico e ainda vou vendo + ou - bem, mas para além das questões fisionómicas - não estabeleço diferenças entre raças, daquelas que aprendemos na escola. Considero que entre pessoas, bastante distintas das restante espécies do reino animal, existe apenas uma raça, que é: a humana!
ResponderEliminarMas sendo todos diferentes (e ainda bem), há uns bem mais humanos do que outros.